quarta-feira, 21 de janeiro de 2009



"Que passe o tempo, que passem os dias.
Que a espera seja recheada de lembranças deliciosas.
E que ao te reencontrar meu corpo se embriague do seu..."


Por Dé Cláudio.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Escoar


O ar tornou-se denso. O mundo silênciou sincronizadamente por um breve instante. Não se ouvia mais o pulsar dos relógios. Um atraso tão perfeito quanto o próprio acaso.
A Abstenção de sons fez com que Sofia, uma mulher de poucas rugas e olhar virtuoso de menina, consegui-se notar o estalar de algo que se partia e caia. O som se assemelhava com o dos próprios ossos se quebrando. Profundo e interno quanto seus desejos e pessoal como suas virtudes.
Olhou ao chão procurando algo despedaçado e encontrou a razão de tal aflição.
Próximo aos seus pés encontrara algumas letras espalhadas. Tentou entender o que aquilo significava. Sem encontrar resposta ela sentiu o peito apertar, uma dor forte a consulmiu. Sentou-se colocando sua mão firme no peito. Uma apneia se seguiu e então suas mãos já estavam encharcadas de sangue. Junto com o sofrimento a resposta veio, do seu peito havia se rasgado a palavra Amor.
Tentou descrer olhando ao céu. Mas só pode ver o azul apático. A tela de um pintor sem inspiração, as linhas vazias no caderno do poeta.
Sofia sangrava e não sabia como nem ao menos a quem pedir ajuda.
Voltou a olhar o chão e ali já se notava que próximo da primeira palavra também estavam dilaceradas as palavras; Perdão, Compaixão, Esperança, Vontade, Desejo e Liberdade.
Sentiu-se menos viva, menos humana e mais carne. Deitou se inundando de medo até que este também escorreu do seu coração rasgado. Lembrou as tantas coisas que havia vivido e as marcas que havia deixado, haveria ainda muito de sangrar.
Ela aquietou e esperou, fechou os olhos, mas conseguia sentir que cada palavra que escorria desfazia sua alma e por não possui-las deixava de compreende-las.
A encantadora mulher de olhar virtuoso foi se dissolvendo. Ao seu redor já podia-se ler as palavras; Adoração, Afeto, Força e Vontade.
Veio do último suspiro a última palavra, do interior do seu peito se emanou em letras o dizia ser a palavra Vida.
Não havia mais suspiro nem o tempo marcado. Apenas sentimentos e virtudes espalhadas.
O sangue secou e tudo se desfez. Não sobrará mais nada. Nem corpo, nem carne, nem letras e pesares.
A vida seguia sem notar que no solo rígido 5 letras fixadas e organizadas se reconstituiram em uma nova palavra. Marcado no aspero terreno era nítido ler, numa única palavra outras mais se destacavam, observavam e se traduziam em Sofia.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Ela Sentiu!


Ela tinha a impressão de que o mundo movia-se em câmera lenta e que as cores ganharam brilho. Ela sorria sem pensar no que viria depois, nem em como chegou até ali.
Ele abraçou-se no seu estreito quadril, sua cabeça repousava sobre aquela morena barriga, e ainda teve forças para beijar-lhe o umbigo.
Jamais imaginei que você fosse assim!
Então sua cabeça tornou-se um peso morto, acompanhado de uma respiração lenta e ruidosa. Não era um ronco, apenas um ressonar.
Ela pousou a mão sobre seus cabelos, fez-lhe um cafuné. Sabia que ele já nem perceberia isso, portanto não se deu ao trabalho de olhar para baixo.
O prazer anestésico perdia seu efeito, e quanto menos deleite sentia no próprio corpo mais sua razão começava a funcionar. Não era exatamente a razão que gostaria de ter, era como uma consciência que a acompanhava depois de toda vez que sentia aquele prazer intenso. Algo que não era dela, mas a acompanhava, como uma memória. Merda, não acredito que estou nisso de novo.
Transar com estranhos era algo com a qual ela facilmente lidava, simplesmente desaparecia. Levantava e ia embora, sem adeus, sem telefone ou explicações. Muitas vezes até o nome era falso, e quando o sujeito a chamava, nem parecia estar referindo-se a ela.
Porém desta vez o problema ganhará outras proporções. Meu vizinho?! Porque o vizinho? Eu sou uma puta mesmo. Mudar-se estava fora de cogitação, ela jamais conseguiria convencer seu pai de novo a ser seu fiador. Amanhã ele vai bater na minha porta. Semana que vem vai querer namorar. Caralho!
Apesar do conflito interno, corporalmente ela expressava enorme tranqüilidade, a mão seguia acariciando-o, o corpo imóvel e o olhar como que serenando no teto. No semblante havia até mesmo um leve sorriso, como se risse de si mesmo. Como se a pessoa que lhe falava com as racionalidades da mente fosse diferente daquela que comandava o corpo, diferente da vadia que acabara de foder.
Nestes momentos preferia lembrar de algo longínquo, como que para despistar a si mesmo. Lembrou-se da infância, vivida em casa simples no interior do estado. Rapidamente trouxe à tona as descobertas do corpo, do prazer intenso com objetos da casa, com outras meninas, do deslumbramento ao pegar pela primeira vez em um pau, tocar-lhe com a boca. Sentiu prazer nas lembranças, as lembranças eram só prazer. E justamente esta busca incessante de prazer a levara até ali. Mas o que há de errado em transar pelo prazer, porra? Não posso só foder e amanhã cumprimentá-lo como um vizinho qualquer? Sempre evitou este tipo de questionamento, talvez pela educação muito religiosa que receberá da mãe, apesar de jamais ter levado-a à sério. Ou então, por medo de chegar à conclusão de que isso era possível, bastava fazê-lo. Mas fazê-lo traria à tona as suas reais vontades, aquelas que ela sempre esconderá sob o manto de uma pessoa simples e normal.
Tentou buscar outras memórias, mas sempre acabava nas mesmas sensações, o gozo, o tesão, os desejos e, principalmente, o corpo. Seu corpo sempre fora uma ferramenta da qual retirou e com a qual conseguiu prazer. Lembrou-se dos meninos que seduzia ainda nos tempos de catequese, quando tinha as tardes entre grandes salas vazias e jardins desabitados da igreja.
Ela sorriu, levou a mão à boca lembrando de tudo aquilo. Rapidamente a consciência encontrava espaço entre as lembranças. O que vou fazer com este homem? Saio agora ou o espero acordar para dizer-lhe algo? Ele até que não é mal e fode gostoso, mas não preciso de mais um andando no meu pé. Já não basta no meu trabalho...
Veio-lhe a lembrança de Vicente, colega de setor que há muito demonstrava interesse nela, e por alguma razão que não descobrira, era o único homem que lhe dava asco.
Decidiu agir pela vontade e não pela idéia que queria passar, simplesmente fechou os olhos e deixou que o sono a abraçasse.
Mesmo adormecida, sentiu quando o vizinho beijou-lhe a testa, antes de deixar a sua casa.
Acordou agitada, tinha a sensação de ter um sonho real, ou uma situação que mais lhe pareceu um sonho. Já sentada na cama, olhou para o teto, pode sentir de novo o peso da cabeça do rapaz sobre sua perna, lembrou-se do sexo, sorrio sozinha. O gozo, o mundo em câmera lenta, a decisão de tornar-se mais autêntica às suas vontades e aceitar a si mesmo, antes que os outros o fizessem.
Só quando chegou a sala e viu a cidade funcionando lenta lá embaixo, que se lembrou que era domingo. Ao vislumbrar o horizonte, levemente quebrado por alguns prédios amontoados no lado oeste da cidade, enxergou a divisa entre o firmamento e o céu como sua própria divisa, sua própria encruzilhada. A qual ela havia cruzado na noite anterior. Aquilo a alegrou, um sorriso largo e verdadeiro nasceu em seu rosto. Ela realmente estava feliz por descobrir-se. Porque tanto tempo depois? Porque só ontem? Porque com o cara da porta ao lado?
Questionou-se se não teria sido aquele amor que ela sentiu ao ver-se nos olhos dele. Seria o amor por ele ou um amor-próprio? Ou seria sua necessidade vital de prazer que atingiu um nível tão alto que não podia mais se ocultar dentro de uma máscara de menina comum? Pouco lhe importava aquilo neste momento, ela estava feliz.
Saiu à rua trajando umas roupas casuais, diferentes dos trajes mais sérios que usa ao longo da semana. Trajes estes menos confortáveis, mas úteis para atrair homens, que adoram um salto alto e uma saia justa. Ela não somente tinha total consciência disto, como sabia muito bem utilizar estes artifícios a seu favor.
Antes de sair, já no portão, permitiu-se olhar para o alto. Uma mistura de desejo e aflição a invadiu quando imaginou que o vizinho podia estar olhando-a. Não viu ninguém e seguiu seu trajeto rumo ao centro da cidade, lá onde o horizonte recortado havia lhe mostrado seu próprio momento.
Estava atrasada para a primeira sessão de cinema daquela tarde de sol ameno e leve brisa outonal. Ela gostava de assistir vários filmes em seqüência. Adorava observar as semelhanças e diferenças entre os roteiros, roupas, rosto, corpos. Na adolescência, era a única a resistir à maratonas cinematográficas de 4 filmes. Enquanto todos dormiam, seus olhos continuavam grudados na tela e seu corpo sempre se aconchegava em algum menino. Ela não saberia dizer o que agradava mais, se os filmes ou os corpos, sob os quais ela se esfregava, sem precisar seduzir ou explicar-se.
Depois de sair do ônibus, não demorou muito a chegar a um antigo prédio de arquitetura rebuscada, com um aspecto sóbrio e ao mesmo tempo artístico, que outrora serviu de hotel de luxo, mas havia sido reformado e agora sediava uma casa de cinema, onde cada um de seus cinco andares, tinham dado espaço à salas enormes, com uma acústica tão boa que nem ouvia-se as vozes dos que conversavam e com telas tão grandes que as primeiras cadeiras ficavam cerca de dez metros da tela.
O térreo era a bilheteria, e o movimento, mesmo nas primeiras sessões, era sempre grande. Entrou no prédio distraída, mexendo na bolsa para procurar a carteira. Ao olhar para frente, seu olhar logo parou sob uma mulher que estava na fila, mas olhava para trás, olhava para ela. Ficou imóvel por alguns instantes. Que foi? Tem medo de mulher agora?
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Texto: L.N.
foto: Cisco Vasques

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Te amo...


Antes de te conhecer eu já havia experimentado o amor sem limites, inegoísta de si. O amor completo, sem barreiras ou apegos. O amor sublime e impossível de ser alcançado sozinha.
Ao encontrá-lo degustei o começo de um novo amor. Dentre alguns que eu já conhecia o seu me pareceu totalmente incomum.
Me mostrou devagar quão impressionante você conseguia ser. E a forma, talvez um vício, de consquistar todos ao seu redor.
Você dizia que eu seria para sempre. Que habitaria seu coração até o fim dos dias. Me disse que eu te completava e que seria impossível uma vida sem estarmos juntos.
Me cativaste, me consquistaste. Me amava e me abraçava da forma que pudera. Confesso que muitas vezes estes não me bastavam, mas sabia que era o seu melhor e me enchia deles tornando suficiente.
Dentre tantos anoitecer juntos tornamo-nos singulares.
Do amor que me mostrava e da importância que me colocava, conseguia te amar intensamente. Pois amava tudo que compreende você; sua natureza, suas angústias, seus medos e amava ainda seu sorriso, seu abraço ou a falta dele. Amava o seu ser como um todo. Amava seus opostos e tudo de melhor que tinha e de pior que possuía.
Naturalmente, meu amor por você foi se transformando. Já não estava mais encantada pelo homem divino que conheci outrora. Mas estava envolvida pelo homem que é. Amava as roupas jogadas pelo chão, as discussões sem próposito, o som alto da tv quando precisava dormir. Amava sua inocência e inexperiência. Te ensinei a apagar as luzes ao sair, a tomar café e a saborear pimenta. Te vesti, te mostrei, te cuidei. Me dei e me doei.
Você me exigia a atenção privilegiada e me teve mais que qualquer um.
E, talvez, por tanto me querer e me ter, me tornava livre com você. Me buscava em ti. Te queria em mim.
Sendo assim, tão eu que sou, você recuou.
Quando meu oposto lhe falou você hesitou.
Notei que você me amava em partes. Que ficará apenas com metade. Cuidava de um lado do meu coração. E o outro fragilizado, descuidado, inconsolado era ignorado. Não lhe importava a totalidade e se saturava com o que lhe satisfazia.
Mantinha-se no patamar que conhecia. Na superfície fina de um lago congelado. Presumi seu medo de romper o gelo e na dúvida que tinha da profundidade do lago.
Meu coração se fez em pedaços. Era vidro estilhaçado. Ele se quebrou, o peito estufou e as lágrimas esvaziavam o que de inflamado estava.
Preenchi sua ausência resgatando os antigos hábitos deixados de lado para que coubesse mais de você.
Voltei a sentir o cheiro da grama e o cantar das ruas. Busquei o melhor de mim. Tive paciência. Lembrei o quanto gostava do vento tocando meu rosto e do calor do sol na pele nua. Pisei com pés descalços na areia da praia e consegui ouvir a melodia do mar.
Me resgatei. Me notei. Me abraçei. Me amei.
Lembrei que antes de você eu havia amado subliminente, profundamente, ardentemente.
Será que lhe falta tempo para perceber? Já não tenho mais tempo a perder.
Me resta lhe agradecer. De tanto te amar me perdi em você. E hoje, sem você, me tornei mais particular; mais essêncial; mais vaidosa e orgulhosa.
Amor, eu lhe digo; Não se perca e não tema. Ainda o amo e te quero bem. Deixei de amar o que não me bastava. E hoje amo a ilusão de que um dia você arderá em algo divino, suplicará o profundo e jamais verá a vida pela camada fina e temorosa que a grande maioria a vê!
Venha! Há algo de muito belo te aguardando, tens capacidade, basta permitir!
Respira fundo, prende o fôlego e jogue-se neste lago frio nadando fundo. E quando lhe faltar o ar, não se assuste, perceberá que é possível respirar em água, caso consiga, se sentirá diferente, não será mais humano; será mais que isso; nascerá um ser intangível capaz de devotar, mas principalmente capaz de amar.
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Dedicado a R.Y.


domingo, 4 de janeiro de 2009

Meus pés sobre a varanda!

O parapeito da varanda recua.
As pontas dos meus pés já não tocam mais o chão.
Meu corpo vai em sentido oposto à queda.
As asas que um dia pousaram de um belo vôo buscam novos vislumbres.
O vento que toca meus cabelos carrega o aroma de jasmim e amêndoas.
Cheiro de terras muito além da minha visão.
Meu coração busca um lar por planícies existentes apenas em contos.
Minha pele hoje queima sozinha. Poucos raios de sol me alcançam.
Minha mente insegura cria raízes na nascente de um rio conhecido e já explorado.
Mas a varanda recua e apenas metade de meus pés se apóiam.
Elas querem ver o mar, as asas têm saudade do canto das francas.
O vento trás novos odores de lírios e damasco.
Cheiro que vem de onde o sol nasce um dia antes.
Acaricia meu rosto a brisa aveludada, conforta-me em seu calor.
Sussurra no meu ouvido “desbrave-se”.

sábado, 3 de janeiro de 2009

Venha!

Mais uma noite fria chega e a cadeira ao meu lado permanece vazia. Aprendi a lidar com a sua ausência, ela me corta, me fere e precisei cuidar das cicatrizes. Esses ferimentos são suportáveis se comparados a ausência do amor que você diz sentir. A falta dele certamente me mataria. Seria então uma morte lenta, teria de me livrar aos poucos da areia que encheu meus bolsos, das taças espalhadas pela casa e das velas que enfeitam o banheiro.
Ainda te espero, como aguardo por dias infinitos. Seu cheiro permanece ao meu lado esquerdo e as diversas notas que certa vez ecoaram por esses amplos salões o convidam, novamente, a dançar comigo. Deixa meu corpo mostrar ao seu que é aqui seu templo. Permita que após tanto tempo ainda possua a pureza e a curiosidade que transbordavam do seu ser.
Anseio por você. Por meses me apeguei a lembrança do seu olhar ciano. E agora que estás aqui, deixe de me ferir com sua ausência. Preencha meus lábios com seu hálito, toma o lugar que é teu por direito e conquista. Me faça perder o medo da morte de não tê-lo.